O terrorismo internacional actúa cegamente ou responde a unha estratexia político-económica? Ten algo que ver a rede Al-Qaeda coas oligarquías do petróleo? Ou, en definitiva, é lícito preguntarse a quen beneficia o terror? Son algunhas das preguntas que se suscitan neste artigo de Celso Álvarez Cáccamo.
Os resultados das eleições gerais espanholas podem ser fruto dum golpe do terror económico internacional. Uma série de circunstâncias faz pensar num plano detalhado de obscuros interesses, em última instância ligados à crise energética mundial e à luta (verdadeiramente) polo controle dos recursos: o petróleo é absolutamente crucial para a indústria pesada, incluída a armamentística. Dentro da obscena lógica do capitalismo internacional, a matança de Madrid é um sintoma de que, na guerra económica, as oligarquias devem respeitar certas regras de jogo, polo seu próprio benefício. Enumero apenas alguns dados e hipóteses, para que quem tiver mais inteligência, as ligue e extraia conclusões. Tudo isto é tão especulativo como grande é a minha ignorância de muitos factos. Em todo o caso, quando se dão eventos históricos desta magnitude é legítimo perguntar-se: A que interesses beneficia a nova situação?
Concorrem nestes acontecimentos vários factos recentes. Podem ser coincidências, ou pode ter sentido ligá-los. Em 5 Dezembro 2003, dous dias antes das eleições parlamentares russas, uma potente bomba estourou num trem de proximidades em Yessentuki, em semelhantes circunstâncias às do massacre de Madrid. Eram as 7:45 da manhã. No ataque morreram mais de 40 trabalhadores e estudantes. A explosão destroçou parte do trem em maneira semelhante à das bombas de Madrid. Discutiu-se se fora um ataque suicida ou uma acção por controle remoto. Putin atribuiu o atentado a "separatistas chechenos". Nunca se soubo quem fora. Dous dias depois, Putin ganhou esmagadoramente as eleições. Em 29 Dezembro foi detido um tal Israpilov como implicado nos ataques. Encontraram-se-lhe explosivos e material para estourar bombas por controle remoto. Em 2001, o Ministério de Interior espanhol informava que alguns dos detidos de "Al-Qaeda" tinham ligações com o terrorismo checheno. Há pouco detiveram-se ainda mais membros de "Al-Qaeda" (dos quais se falou muitíssimo menos que dos da ETA). Em 12 de Março informava-se que agora mesmo o exército EUA está a realizar operações em Algéria contra as brigadas salafistas, que têm membros residentes em Grã Bretanha, França e Espanha. O massacre de Madrid tivo lugar no dia 20 Muharram 1425 no calendário religioso islámico (de base lunar, não solar), exactamente no aniversário islámico das grandes manifestações em Espanha e todo o mundo contra a invasão de Iraque (23 Março 2003, isto é, 20 Muharram 1424). Curiosamente, o vídeo de Abu Dukhan Al-Afgani ("Pai do Fume, O Afegão"; Gebel Abu Dukhan é o nome duma montanha em Egipto) que reivindica o atentado, refere-se a um aniversário cristão ("Dous anos e meio depois" do 11 S), o qual faz duvidar do carácter fundamentalista religioso dos autores, da verossimilitude do vídeo, ou de ambas cousas. Em qualquer caso, ao dia seguinte do massacre, milhões de pessoas saíam de novo à rua no Estado Espanhol contra o terrorismo, quer dizer, contra a guerra. Dous dias depois, as eleições espanholas forçavam um novo governo.
As circunstâncias políticas dos países da "aliança" também merecem comentário. Parece que, pouco antes dos atentados, o Partido Popular estava a perder pontos e até a maioria absoluta. Mas para nada estava assegurada tal vitória do PSOE. Por sua parte, o Partido Republicano dos EUA já começara a sua campanha eleitoral capitalizando a mensagem antiterrorista até com imagens do remoto 11 de Setembro 2001. Mas existe também a impressão de que pode ganhar o candidato democrata, John Kerry. Portanto, de cumprir-se alguns prognósticos, sem o atentado de Madrid poderíamos encontrar-nos com um binómio Kerry-Rajoy, não já com o tandem Bush-Aznar. E Blair está também debilitado. Bush representa a possibilidade duma nova intervenção em oriente méio (Irão, Síria) polo controle dos recursos energéticos. Kerry pode significar um hiato táctico na campanha de terror contra o Golfo Pérsico, um hiato no qual, sem abandonar o Iraque, os interesses se dirijam agora a África Ocidental, com grandes reservas de petróleo ainda sem explorar (sem dúvida um novo "golfo pérsico", como alguns analistas o chamam, mas sem as turbulências daquele). África pode ser, por uma série de razões, um alvo militar e económico muito mais fácil para o capital ocidental.
A presença de tropas ocidentais em Iraque garante o estabelecimento duma "constituição democrática" que ameaça as famílias oleogárquicas do Golfo. O "efeito dominó" dos ataques de Madrid pode acelerar a retirada de tropas ocidentais de Iraque, uma situação mais aproveitável para o "fundamentalismo islámico" (quer dizer, os oligarcas sauditas, "Bin Laden" incluído). Certo, a possível presença de tropas conjuntas da ONU no Iraque não elimina totalmente o risco de ataques em países ocidentais. Mas é possível que a nova constituição definitiva (?) que surgir das eleições em Iraque (não antes de finais de 2004) tenha muito pouco a ver com a provisória actual. Em todo o caso, uma "democracia" no Iraque debilitaria a autocracia saudita, por exemplo, e certos opressivos valores do "Islão" em que se escuda a sua forma de dominação.
A tragédia de Madrid e o resultado eleitoral em Espanha podem precipitar uma reconfiguração das peças na guerra económica internacional. A retirada das tropas espanholas poderia relaxar a ameaça de mais atentados em território espanhol: simplesmente, o terror é uma táctica, não um estado permanente de cousas. Mas é claro que outra parte beneficiada é "Al-Qaeda". O ataque demonstra que, quando se vulneram flagrantemente as regras da guerra santa entre as grandes famílias económicas (uma vulneração que começou muito antes do ataque do 11 S 2001, que pode ser interpretado como uma advertência perante um plano já pré-desenhado dos EUA para invadir o Afeganistão) pode haver terríveis consequências. A capacidade de pressão do "terrorismo islámico" é, neste sentido, muito grande. O petróleo está fundamentalmente sob os "seus" territórios, nos "seus" países. Os interesses de "Al-Qaeda" não são só recuperar os "seus" territórios (todo o Islão!, incluindo o Iraque) para reestabelecer um regime teocrático medieval, mas também ter bons clientes petroleiros entre os países industrializados: a China, cliente de Irã; Europa e Rússia, clientes do Iraque; EUA, cliente de Arábia Saudita. Donos do seu petróleo, os oligarcas poderiam negociar mais facilmente com uma Europa mais dócil militarmente (Alemanha, França, uma Espanha reincorporada, uma Rússia de Putin) do que o fazem com o ávido eixo anglo-saxão. E a sua mensagem é que, se a voracidade do grande capital industrial de Ocidente deseja este petróleo, agora que só restam tão poucas décadas dele, deve aprender a pedi-lo e a negociá-lo, sobretudo quando as famílias oligárquicas da região têm de garantir também a sua distribuição para os próprios interesses da sua classe. O capital industrial americano, por exemplo, deverá diversificar os seus alvos de "segurança energética" (algo explícito, além, nas próprias recomendações dos think-tanks conservadores americanos), olhando para África e América do Sul. Por isso, espero atinar com a hipótese de que "França" ou "Alemanha" não são objectivos de "Al-Qaeda" na altura. E espero que esteja errada a hipótese de que sim que o são "Grã Bretanha", "Itália", "Polónia", "EUA" e "Austrália", estes dous últimos, com próximas eleições em finais de 2004.
Com a invasão de Iraque, o sector hegemónico do capital espanhol ("Aznar") apontou-se a uma viragem arriscada: favorecer-se dos EUA para as contratas petroleiras em Iraque, e talvez para a exploração do possível petróleo das Ilhas Canárias e do seguro petróleo frente à costa do Sara Ocidental, calculando que dentro do clube de Europa não poderia competir com economias mais fortes polo reparto dos recursos. Numa ocasião, dantes da invasão de Iraque, Aznar disse-lhe a Zapatero no parlamento: "Se você estivesse no meu lugar, faria o mesmo". O apoio de "Espanha" aos "EUA" era, portanto, uma questão de Estado: de assegurar-se o acesso aos decrescentes recursos por décadas por vir. Essa política está a fracassar tragicamente, com milhares de mortes no Iraque, Marrocos, Turquia, Espanha. Agora o relativamente modesto capital industrial espanhol deveria restaurar alianças com o européu, sem pretensões de grandeza económica, e com muita cautela perante os actuais e futuros detentores do petróleo mundial.
Mas provavelmente ainda restem muitas décadas de tragédia: até que dure o petróleo. No entanto, como sempre, será a gente de toda parte quem continuará a pagar o piche com sangue.