[…]todo cambio en Galicia de la política electoral española tiene que traducirse forzosamente en un cambio de caciques, porque toda la actuación política del régimen está basada en la ficción del sufragio universal mediante la protección a las oligarquías adeptas al mismo: el caciquismo gallego responde a un estado canceroso del organismo social provocado y mantenido por la actuación del Estado, continuador de los intereses y de la política criminal y centralizadora de los Reyes Católicos. Arturo Noguerol.
Penso que não há que ter lido nas hemerotecas La Voz de Galicia desde a sua fundação até a Guerra civil, nem ter perdido muitas horas estudando e tentando entender a complexa rede caciquil da Galiza da Restauração; nem outras tantas de alucinado pesquisar sobre o medievo, a Galiza dos Áustrias, a francesada e as últimas proclamas soberanistas do Século XIX, para compreender que sob a fascista caudilhagem do franquismo se agacha o belicoso gerifaltismo do chieftain ártabro da Casa de Andrade; nem mesmo é mester ter acompanhado a política galega desde a Transição para se chegar à conclusão de que, se bem na Galiza não se desenvolve uma articulação nacional correspondente à sua população e territorialidade, por entanto sim se desenvolveu uma poderosa rede de poder conservadora que se vai articulando em diferentes formas de representação histórica ou em partidos políticos.
Ou, mais simplesmente, que os políticos galegos de raça e os nossos notáveis, são o resultado de uma estrutura caciquil fortemente artelhada e característica em forma de pirâmide que tem a sua base no mais recôndito do espaço e espírito territorial local e a sua cabeça, com um discurso formal, de espanholismo militante ou do que mais convier, em Madrid, ou onde seja que o Poder habite.
Caciquismo estrutural e ao mesmo tempo personalismo na concepção do poder entendido como solidariedade e quinhão de benefício inter-grupo e lealdade absoluta ao chefe acatado definem uma estrutura de poder que toma do continuum mais remoto a sua legitimidade e do presente mais imediato os recursos, estratégias e discursos que configuram as mensagens, programas e oratória.
Por baixo, nem ideologia, nem construção de País. Os notáveis indígenas, fiéis a uma tradição anterior ao feudalismo, concebem o patriotismo em função do poder local e da hierarquia fidelizada a uns elementos superiores, através dos quais se movimentam em degraus e onde fazem carreira ascendente em direção ao centro do Poder. Poder que antigamente era a Corte onde residia o Monarca e, desde o século XIX, o intrincado Madrid do Parlamento, os ministérios, a alta judicatura, a imprensa, a grande empresa, a bolsa.
Neste sentido, é difícil que dos partidos tradicionais na política galega possa sair uma figura que não entenda Madrid como meta, os cargos como passos e que não ache que a estrutura (o partido) é apenas uma escada pessoal de superação.
Porque é curiosa a dinâmica: o germolo de futuro cacique (por aquilo da proximidade e o local) é – ainda que chefe entronizado segundo os mais atigos ritos - um mais, pegado à terra, e portanto capaz de liderar a revolta contra do invasor ou proteger – por riba de qualquer circunstância- no âmbito territorial os seus; agora, à medida que sobe os degraus do poder, já começa a apanhar esse espanholismo crescente que define a sua passagem do “regionalismo sano y bien entendido” às ligas maiores do ultra espanholismo militante, e a sua oratória em função do poder e do discurso do galeguismo competidor. Porém, na escala descendente, quer como veraneante quer por causas temporárias ou definitivas, é fascinante o apelo e imersão no folclórico até os graus da conversa paisana.
E digo de celtas, territórios, torres, expulsões, cães e estribos, porque apesar disto tudo e do conto da língua, do marketing e da austeridade, a única diferença importante que acho entre Fraga e Feijó é que um vinha qual elefante ao cemitério totêmico passar os seus últimos anos depois de uma vida inteira em Madrid, entanto o outro, parvenu a quem as circunstâncias deram chance, ainda tem de chegar a Madrid, mesmo que para tal queime – mais uma vez - o país e descubra o jogo de máscaras - a quem pode surpreender- pactuado na Autonomia.
Pois o verdadeiramente interessante é que sociologicamente Feijó, por acaso (dado que o perfil corresponde aos ainda secundários brilhantes, como Rajoy no seu dia, que devem madurar e desfogar seu brio e ambição na guerra e na corte longe) rompeu a dinâmica consagrada desde o início da Autonomia pela qual os candidatos conservadores galegos eram aposentados de Madrid entanto os do PSOE, mais novos, eram, no mais puro centralismo jacobino, delegados técnicos locais, com algum vencelho indígena, designados desde Madrid.
Não importa, pois – e esta volta à restauração canovista deveria servir-nos de lição – quem governar, nem mesmo qual o Partido, apenas se o candidato a presidente vai para Madrid ou vem de lá. A questão é pois não de liderado, não de partido, não de promessas, “pautos” ou programas, senão estrutural, dado que os notáveis galegos, ao mesmo tempo conhecedores subtis das formas e escalas do poder político, carecem tanto de imagem de País como de escrúpulos.
Porque cuidar que um político galego não pensa em Madrid como a meta do opositor senão em infra-estruturas, território, portos, desenvolvimento, internet, comunicações, cultura, língua a sério seria tão absurdo como acreditar que existe um partido político na Galiza sem obsessão pelo controlo, fidelização e purga da estrutura caciquil do aparato.
(A Crunha, 1970) Da Academia Galega da Língua portuguesa, Doutor em Filologia Hispânica (secção de Galego Português), especialista em história do impresso galego na etapa contemporânea. Tem focado os seus contributos arredor do movimento das Irmandades da Fala, a figura de Angel Casal e o mundo do livro galego. Trabalha como bibliotecário na Universidade de Valladolid.
»